Há dias em que a luz parece permanecer no rosto dos nossos filhos, e outros em que o cansaço ofusca o mundo inteiro. Há essa dança delicada, quase silenciosa, a que chamamos de maternagem intensiva: uma dádiva total de si, dia e noite, uma presença que não cessa, mesmo nos silêncios. E no centro desta oferta quotidiana, há – ou deveria haver – um parceiro.
Não apenas uma testemunha. Não um “pai que ajuda” ou um parceiro em segundo plano. Não. Um verdadeiro presente, um pilar que sustenta, uma respiração que alivia, uma mão que estende.
Porque ser mãe intensamente não é só dar de mamar e embalar. Significa carregar a criança no seu corpo, depois nos seus braços, depois no seu coração – sem nunca largar realmente esse peso invisível. Significa acolher cada emoção, cada despertar noturno, cada grito de necessidade como um chamamento sagrado. Significa viver em constante vigilância, suave mas poderosa. E requer uma energia que o mundo moderno tem dificuldade em honrar.
Mas o parceiro pode ser o mundo que compreende.
Estar presente, realmente presente
Ser parceiro de uma mãe que é mãe intensamente não significa “substituir” ou “delegar”. Trata-se de viver o mesmo espaço interior, com uma consciência semelhante de presença, cuidado e lentidão.
Significa chegar à sala e sentir se o ar está carregado de emoção ou de paz.
É estar em silêncio quando é preciso, e oferecer chá quente sem ser pedido.
É ler nos olhos de uma mãe que ela precisa de mais dois braços, ou de uma hora sozinha, sem filhos ou perguntas.
É compreender que às vezes ela não precisa de soluções. Apenas um olhar que diz: “Estou a ver-te. Não estás sozinha nisto tudo.
Uma lufada de apoio
A maternidade intensiva pode ser como um mar sem costa. Muitas vezes flutua-se, outras vezes afoga-se. E aqui, o parceiro pode ser essa costa suave – não para a forçar a regressar a terra, mas para lhe proporcionar um lugar onde se ancorar.
Este apoio não envolve necessariamente grandes gestos. Vive no quotidiano: arrumar a mesa sem fazer grande alarido, preparar a refeição enquanto o outro está a amamentar, dar banho enquanto se espreguiça no quarto ao lado.
São esses gestos que dizem: “Estou contigo nesta viagem. Mesmo que eu não sinta tudo como tu sentes, estou a teu lado.
Um companheiro de ritmo lento
A maternidade intensiva convida-nos a abrandar, a viver ao ritmo de uma criança. Mas abrandar não significa parar: significa sentir-se plenamente.
E nesta lentidão escolhida, o companheiro pode tornar-se o artesão de uma vida quotidiana habitada.
Criar um cantinho de leitura. Cozinhar suavemente com uma criança ao colo. Cantar em dueto no banho. Repetir uma canção todas as noites, como um mantra.
Estes rituais simples, realizados em conjunto, tornam-se âncoras no mar da vida quotidiana. Tranquilizam a criança, mas sobretudo alimentam a relação. Porque a maternidade não é apenas um laço entre mãe e filho: é uma constelação familiar que precisa de todas as suas estrelas.
Enfrentar as tempestades
Por vezes, a maternidade intensa pode ser esgotante.
Por vezes, as mães choram.
Tem dúvidas.
Ela afunda-se.
E é nessa altura que o papel do parceiro se torna sagrado. Não para consertar. Mas para acolher a sombra sem a julgar.
Abraçar a mãe como ela abraça a criança.
Oferecer-lhe um lugar de escuta radical e de presença terna.
Dizer: “Tens o direito de estar cansada. Tens o direito de estar farta. Tens o direito de respirar. E eu fico aqui mesmo.
Sê a árvore enquanto chove.
Co-criação quotidiana
Pensamos muitas vezes que a maternidade é um assunto para as mães. Que os pais, ou parceiros, gravitam em torno dela. Mas, na realidade, é um processo bidirecional.
Quando o parceiro se envolve verdadeiramente, cria o espaço para que a mãe continue a ser tão mulher, tão humana, tão viva.
Ele pode assumir o controlo, não como um substituto, mas como um segundo coração que bate.
Pode também ser o elo de ligação entre a mãe e o mundo – organizar um passeio, criar um interlúdio, convidar a luz quando tudo parece turvo… existir”.
E neste espaço de respiração, ele devolve à mãe o direito de ser ela própria.
Um caminho de aprendizagem mútua
O papel do parceiro não pode ser dominado de um dia para o outro. É algo que se descobre, se aperfeiçoa e se ajusta. É construído com base num diálogo honesto e por vezes incómodo. É moldado por tentativas, erros e reconstruções.
Mas nesta vulnerabilidade partilhada, nasce uma forma mais humana, mais verdadeira e mais profunda de paternidade.
O parceiro aprende a observar sem julgar.
A agir sem apagar.
A apoiar sem controlar.
E a mãe também aprende a confiar, a delegar sem perder a sua bússola interior, a acolher a imperfeição na dança a dois.
O parceiro, guardião do fogo sagrado
Nas noites longas, nas sestas curtas, nas refeições frias e nas meias mal colocadas, há um fogo que se mantém aceso: o fogo do amor.
O companheiro, numa rotina diária de maternidade intensiva, torna-se o guardião deste fogo. Assegura-se de que o cansaço não o apaga. Reacende as brasas quando estas enfraquecem. Sopra suavemente a chama quando esta se apaga.
E juntos, dia após dia, constroem uma casa interior. Um lugar habitado. Um lugar de ligação.
Porque ser mãe intensamente não é um sacrifício: é uma oferenda.
E para manter essa oferenda viva, são necessárias duas mãos, duas respirações, dois corações – batendo um pelo outro, e ambos pela criança.

Escrito por Alexandrina Cabral
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